CARTA ABERTA
AOS PROFESSORES DA EUCE, UVA E URCA
Sobre o
nosso Piso Salarial e outros temas da atual conjuntura
Caros colegas, professores:
Inicialmente,
gostaria de prestar minhas homenagens ao amigo e ex-presidente do SINDICATO DOS
DOCENTES DO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ - SINDESP, Professor
Luiz Boaventura de Souza, falecido recentemente, em março de 2016. O nosso
respeito por sua perseverança, dedicação e lealdade à nossa categoria, na luta
em sua defesa, especialmente pela implantação do nosso Piso Salarial. Nossa
solidariedade à sua família. Saudades.
Meus colegas. Acabamos de sofrer,
agora, mais uma punhalada nas costas. Os responsáveis por mais uma punhalada em
nossas costas foram nossos governantes, os atuais mandantes, que se fazem donos
do Estado do Ceará.
Isto não é de surpreender. Os
políticos, de modo geral, nossos supostos “representantes”, em campanha
eleitoral, prometem defender os interesses da sociedade civil, especialmente
dos trabalhadores, seguir o programa de seu partido etc, mas quando se elegem,
esquecem as promessas e passam a defender seus interesses pessoais, os interesses
dos ricos, principalmente, dos grandes empresários do comercio, da
indústria e, máxime, dos banqueiros. Não é de admirar, pois são deles
que advém o dinheiro para financiamento de campanhas eleitorais e também a
famosa “propina”, conforme se pode constatar diariamente na midia. Não é à toa
que o Governo Federal paga mais de UM
BILHÃO de reais POR DIA, só de juros da dívida pública interna, sem abater o
principal. Isso é dito e sabido amiúde. Já sabemos que os políticos, de modo
geral (ainda não digo, universal), são corruptos e defendem os interesses
de seus “donos”. Mas a punhalada que
dói mais é a da traição. Da traição
daqueles que se dizem defensores dos interesses dos trabalhadores ( e falo dos
trabalhadores, pois os capitalistas já tem os seus próprios “defensores”), porém,
ao assumirem o poder, renegam suas origens trabalhistas. Senão, vejamos.
Há várias décadas atrás, Getúlio
Vargas, por um momento, se passou por representante dos trabalhadores e
instituiu a CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas - assegurando um rol de direitos para a classe
laboriosa. Passados mais de 70 anos, de “avanço” do Capitalismo em nosso País,
ao invés de terem ampliado seu leque de direitos, os trabalhadores vem sofrendo,
gradativamente, a perda de seus direitos adquiridos, especialmente nesta época
do tal “Neoliberalismo”. Isto é progresso? Não, na verdade, é retrocesso. Desde
o governo neoliberal iniciado em 1994 e até agora nós, trabalhadores, estamos
constantemente perdendo direitos. Mas não é de admirar que os representantes do
capital financeiro internacional retirem direitos dos trabalhadores. Mas um partido que se diz trabalhista fazer
isto é traição! E, infelizmente, Companheiros, aguardem mais pancadas no futuro, com a tal reforma da Previdência
Social. Ou Previdência medicossocial. Esperemos!
Nós,
professores do ensino superior público do Ceará, neste mês de junho, fomos
surpreendido, como dissemos, com mais um ataque contra os nossos direitos
adquiridos. A suspensão do pagamento de uma parcela da dívida trabalhista
que o Estado do Ceará nos deve e que vinha sendo paga mensalmente por via de coação judicial. Pois bem, nossos
governantes, em parceria com a Justiça (Justiça?) do Trabalho, suspenderam este
pagamento, que é um direito adquirido, e adquirido através de sentença judicial
transitada em julgado no Supremo Tribunal Federal. E veja: quem fez isso foi o governo trabalhista do Estado do Ceará, que se
elegeu com promessa de defender os interesses dos trabalhadores, os interesses
sociais das camadas exploradas do Ceará. Fez isso, em aliança – ou
cumplicidade? – com a tal “Justiça do Trabalho”, repetimos. Alegam os governantes, pelo que se sabe, falta
de dinheiro. E as finanças do Estado não estavam saneadas? E por que não falta
dinheiro para os grandes empresários que prestam serviços ao Estado, que fornecem insumos ao
Estado? Será por que saem das mãos deles a “grana” que financia a política dos
nossos “representantes”? Ora, alegar falta de dinheiro, na nossa opinião, não é
desculpa. Nenhum governo, de qualquer lugar do mundo, possui dinheiro suficiente
para fazer tudo que almeja. E se não o tem, o que faz? Simplesmente, estabelece
prioridades e investe a maior parte dos recursos naquilo que julga prioridade
para a sociedade. No caso do governo cearense, que se diz trabalhista – e
conhecemos seu programa partidário - socialdemocrata, “socializante”, seu
compromisso, que assumiu desde quando ingressou em seu partido, foi de investir,
prioritariamente, na área social, especialmente na educação, saúde e segurança
pública. Isto é prioridade, não só dos partidos trabalhistas, mas uma exigência
ética, especialmente nos países do “Terceiro Mundo”, para usarmos uma expressão
da época da guerra fria. No entanto, a prioridade desses governos – federal e
estaduais -, no momento, é pagar juros aos banqueiros,
esses mesmos banqueiros e seus parceiros que desejam – vejam-se as notícias na imprensa - se apossar
da Petrobras, dos nossos portos, aeroportos, do Banco do Brasil, da Caixa
Econômica, dos Correios, da Eletrobrás, das rodovias, da casa da moeda, das riquezas da
Amazona etc, se não reagirmos. E, o
que é pior, sem gastar nem um “tostão de
mel coado” do seu bolso, mas somente com os juros que acumularam
financiando a rolagem da nossa dívida pública interna. Tal dívida se originou no
governo tucano, no final do século passado. No Governo Itamar Franco, essa
dívida girava em torno de 63 bilhões de reais. Os governantes da época,
alegando sanear as contas do Estado, ajudar bancos privados etc., elevaram os
juros quase ao patamar de 50% ao ano
- refiro-me ao juro oficial do governo
ou Taxa Selic - transferindo dinheiro
para os empresários e banqueiros (estes, na realidade, não são empresários, mas
“agiotas oficiais”), com o qual “compraram” nossas empresas estatais, nosso
patrimônio e, ao invés de quitarem nossa dívida pública interna, elevaram-na ao
patamar de 800 bilhões de reais. Consequentemente, ficamos sem boa parte do nosso
patrimônio e ainda aumentamos em mais de 12 vezes a dívida pública interna.
Isto sim, é que “administrar” bem! Isto sim, é que é Neoliberalismo! De lá para
cá, nossos governantes só fizeram “rolar”,
refinanciar a dívida pública, que hoje está em torno de 2,79 trilhões de
reais. A estratégia da banqueirada é simples, basta observamos com atenção para
compreendê-la. Já que a Justiça do Brasil não funciona e por isso mesmo incentiva a corrupção e garante a impunidade – a quem interesse esse tipo “justiça”? –
então é só jogar os políticos ladrões para administrar nossas empresas, a fim
de quebrarem-nas, endividá-las, inviabilizá-las e, depois, denunciar o Estado
brasileiro como mau gestor. Em seguida, ” compram” essas empresas estatais a preço
simbólico, apossando-se do patrimônio que restou e, principalmente – do seu Know how e do seu mercado. Dessa maneira, OS ESPECULADORES ganham nas duas pontas: no
início do processo, corrompendo os políticos (e/ou aproveitando a corrupção
já existente), que endividam o Estado a fim de pedirem cada vez mais dinheiro
emprestado e, em geral, a juros altos. E, no
fim do processo, quando a dívida está grande, transformando tal dinheirama
(acumulada graças aos juros altos) em ativos das empresas, enfim,
se apossando das riquezas do Brasil e – pasmem! – sem gastar um único centavo
do seu próprio dinheiro. Usam apenas o dinheiro dos juros que receberam.
Isto sim, é que é “investimento”... E ainda dizem que o Brasil não é um lugar
bom para se ganhar dinheiro...
E o atual Presidente da República, interino, parece
que vai seguir, consciente ou inconscientemente, o mesmo catecismo entreguista,
lesa-pátria, adotado pelo tucanato. Não estou afirmando que Sua Excia., a
autoridade maior do país, proceda de má fá. Posso até acreditar em sua boa
intenção. Sabemos que a boa intenção é condição necessária para a realização
de um ato dentro da ética, mas nem sempre é condição suficiente para a sua
efetivação. Por isso, a sociedade precisa ficar de olho nas ações do
Banco Central e da área econômica em geral. Esta equipe econômica está
publicamente ameaçando de aumentar os impostos, dizendo que o país está quebrado,
que isto em grande parte é culpa do governo anterior, que a previdência social
está falida etc., etc. Tal equipe econômica, não seria testa de ferro dos
grandes grupos econômicos, que pretendem retirar direitos adquiridos dos trabalhadores? Não
estaria aterrorizando os empresários com ameaças de mais impostos e encargos a
fim de se chegar a um impasse onde só existirá uma única solução - transferir o patrimônio, as riquezas da
União, do povo brasileiro, para os
grandes grupos liderados pelo setor financeiro? Para fazer isso, bastaria
contar com o apoio dos empresários brasileiros, ou parte deles, que, como já
estão apertados, muito provavelmente aceitariam o desfecho final, o “destino”
imutável, como salvação - que seria a entrega
do patrimônio público ao capitalismo predador. Provavelmente, tratariam de
conseguir algum proveito dessa possível farra com a dilapidação do patrimônio
nacional.
E mais uma perguntinha: a quem
interessa, em última análise, a corrupção e a impunidade que se alastram no
Brasil? Ora, especialmente AOS ESPECULADORES, os que enriquecem com juros exorbitantes,
é óbvio, pois são eles que mais ganham com as roubalheiras. E ganham muito.
Eles sabem que é mais barato comprar os políticos do que as riquezas de um
país.
Conta o anedotário popular que, na Roma antiga,
existia um homem rico que desejava muito possuir as férteis e produtivas terras
de um vizinho. Mas este se recusava a vendê-las. E por isso pedia sempre um
preço muito alto, sabendo que ninguém as compraria por um preço tão
escorchante. Na realidade, não queria se desfazer de suas terras. Mas era um
homem muito louco por dinheiro, pelo ouro. Então, alguém soprou no ouvido
daquele que desejava comprar as terras, que o vizinho era apaixonado por ouro e
sugeriu que o comprasse como escravo. Na época, a lei permitia que alguém se
vendesse como escravo. “Ora – dizia o conselheiro – comprá-lo como escravo sai
muito mais barato do que comprar suas terras, mesmo que estas fossem vendidas a
preço de mercado. Uma vez tornando-se senhor deste proprietário,
automaticamente tais terras serão suas”. E foi o que o sabido comprador fez. E
assim foi feliz para sempre. Isto aqui é
uma anedota, mas com relação ao Brasil é uma realidade.
O Brasil é muito rico e seria difícil comprá-lo a
preço de mercado. Sai muito mais barato comprar os políticos, fazê-los
endividar o Estado e, depois, se apossar das nossas riquezas. Em troca, o
Poder Judiciário garantiria a impunidade ou faria, no máximo, um arremedo de
punição. É fácil e prático.
E mais outra perguntinha - por que
os corruptos estão quase sempre na direção dos partidos, dos sindicatos, das
instituições em geral? Uma das causas é simples. O homem honrado só possui um
caminho a seguir numa disputa por cargo ou posição: que é o caminho da honestidade.
Já o homem desonrado tem à sua disposição dois caminhos: o da honestidade e o
da desonestidade. Usa a honestidade quando lhe é conveniente e a safadeza, o
conchavo, a traição, quando necessário. Numa disputa por algum objetivo, desde
o início, o desonesto já sai ganhando de dois a um. É por isso que o povão diz:
políticos são como feijões crus na
água –
só sobem os podres.
Platão diz que nenhum político é
honesto. Ele se referia naturalmente à corrupta Atenas de seu tempo. Mas é possível
que ainda existam políticos honestos? Ora, assim como dentre espinhos nascem flores, por que não poderia um
político honesto nascer do meio desse cipoal de corrupção? Mas reconhecemos
que é muito difícil um homem honesto chegar ao poder, ao posto de mando, nas
instituições do Brasil. E, se chagar, o que poderá fazer no meio de tantos que
são desonestos?
Esses
grandes grupos precisam aprender que é necessário deixar um mínimo de
esperança para o povo conseguir resolver seus problemas dentro do quadro
jurídico do Estado de Direito. Em
verdade, estamos numa ditadura que mata por tortura. Que é, senão tortura, a morte daqueles que falecem gritando de dor
nos corredores dos hospitais, sem receber os devidos cuidados? Que é,
senão tortura, a realidade de que 40% dos que tem câncer não são atendidos no
prazo legal e acabam morrendo prematuramente em consequência do atraso
no atendimento? Que é, senão morte por tortura, quando um subalimentado contrai
uma doença oportunista e perece à míngua, sem assistência medicossocial? Quando
o povo brasileiro descobrir que é melhor morrer de desgraça do que de miséria,
certamente haverá rebelião e talvez rebelião muito violenta. E não estou aqui
pregando a desobediência civil. Estou mostrando uma realidade, uma questão de
fato, que ocorre no Brasil: a roubalheira desenfreada e o povo na miséria, sem
educação, sem assistência médica, sem segurança pública e, se não houver um reforma previdenciária
justa, sem seguridade social. E, também,
me baseando na doutrina do filósofo inglês, John Locke, o pai do Liberalismo,
tão elogiado pela burguesia, quando se trata de usar sua filosofia como
ideologia em defesa do capitalismo liberal.
Mas Locke tem um outro lado. Ele defende
o direito de rebelião. É só ler o seu “Segundo Tratado do Governo”. E o que ele diz não é coisa de comunismo pois
este prega uma revolução, isto é, mudança radical nas estruturas da sociedade,
substituindo o sistema capitalista pelo sistema socialista. Ora, Locke não defende a derrubado do sistema
capitalista, mas a derrubado dos
governantes no sistema capitalista. Para Locke, o governante é apenas um
fiel depositário da confiança do povo, da chamada “sociedade civil”. No momento
em que trai esta confiança, o pacto social se desfaz automaticamente. O governante deixa de ser representante do
povo e este pode derrubá-lo inclusive pela violência. É isto que os atuais
“neoliberais” esquecem, porque na realidade este tal neoliberalismo é apenas um
conjunto de propaganda midiática enganosa para encobrir os interesses dos
grandes grupos monopolizantes, dos oligopólios, que pretendem se apoderar das
riquezas das nações, principalmente dos países em desenvolvimento. Recentemente,
analistas da área econômica constataram que durante a tal “crise” (provocada ou
incentivada pelos grandes grupos?) de 2008-9, os muito ricos (pessoas físicas e
jurídicas) ficaram mais ricos e houve uma maior concentração de renda, em nível
mundial. O tal liberalismo só é bom quando satisfaz à ganância dos grandes grupos
econômicos - o resto é tapeação.
Voltemos ao caso do Sistema
Previdenciário, o setor escolhido agora para ocupar espaço na mídia e ser o
vilão da vez. Os nossos governantes faliram a previdência, ora por incompetência
administrativa, ora por roubalheira, e ora por retiradas irresponsáveis.
Atualmente, desejam sua “reforma” e, suspeitamos, para fatiá-la e privatizá-la,
se puderem. Desde Juscelino Kubtischek (ele mesmo o confessa em seu Livro “Por
que construí Brasília”, 2ª edição, Senado Federal, 2009) se retira dinheiro da
Previdência, para não recuarmos mais no tempo. Este grande estadista cometeu essa
falha: confessa que retirou dinheiro da Previdência para construir nossa
Capital. Os militares, nos governos seguintes, também usaram dinheiro da
Previdência para construírem as grandes obras da época. Ora, não somos contra que
se retire esse dinheiro ocioso da Previdência para aplicar na construção de
obras, contanto que este dinheiro seja
devolvido com juros e correção monetária, o que não fizeram. E, agora mesmo, o
Congresso Nacional está aprovando a elevação da DRU (Desvinculação das Receitas
da União), de 20% para 30% do orçamento federal. Quer dizer, o Presidente pode retirar até
trinta por cento do dinheiro de um setor para gastar em outro, sem aprovação prévia do Congresso. Assim, o
governo se livra das famosas “pedaladas” e ainda pode desviar até 30% da
previdência, da Saúde, da Educação, da área de Segurança etc., sem cometer
crime de responsabilidade. Isto sim, é receber um cheque assinado em branco.
Ora, não existe o tal “problema” da Previdência. O que ocorre é má
administração. Existe um ramo da matemática aplicada (Estatística), chamada Atuária que trata do assunto. É só
aplicá-la e seguir as regras do jogo, pois o que existe, como se disse, é má
gestão. É ótimo, para os governantes, praticarem rombos e mais rombos e depois
jogarem as dívidas nas costas dos trabalhadores. A solução é o governo pagar o
que deve à previdência e, daqui pra frente, criar mecanismos de controle que
tapem esse barril sem fundo. E que o governo não administre, sozinho, os fundos previdenciários, mas que contem com
fiscalização de representantes das classes trabalhadoras e empresariais, além de
usar o mecanismo do resseguro, como
mais um recurso de precaução. E que a justiça volte a funcionar, punindo seus
saqueadores. É verdade que, como reza o ditado popular, não existe cofre forte
pra ladrão eficiente, mas as medidas de precauções dificultam bastante as
fraudes. O que não se pode é facilitar a roubalheira, como ocorre hoje.
Mas não nos iludamos, companheiros. Se esta Reforma
previdenciária for aprovada em nível federal, muito provavelmente será
para retirar mais direitos adquiridos dos trabalhadores. E tal reforma
vai certamente repercutir nas Unidades da Federação. O fato de o Governo do
Ceará não ter dado ainda aumento – ou reajuste - aos servidores neste ano é mau sinal e poderá até
contribuir para mais um assalto aos direitos dos trabalhadores em nosso Estado.
Senão, vejamos, por hipótese, o que poderia acontecer – e esperamos que não
aconteça.
O governador anterior, Sua Excia.,
Sr. Cid Gomes, foi mentor da Lei que antecipou
a data base dos aumentos ou reajustes dos servidores públicos estaduais,
passando a data de junho para janeiro de cada ano. Prometeu que daria no mínimo
a inflação acumulada do ano, pois – é claro - se não fizesse isto, não estaria
fazendo “reajuste”. E cumpriu o que
prometeu. Mas o que fez o seu sucessor, um trabalhista? Até agora só deu
reajuste ( como “reajuste” se foi abaixo da inflação acumulada de um ano?) para
quem ganha o piso salarial do Estado. A
maioria das categorias vai ter que “negociar”. Quer dizer, meter o
pescoço no laço da forca. Serão categorias fragilizadas, talvez endividadas no comércio
e subordinadas a um governo insensível, negociando com quem tem o tacão de
ferro na mão. É aí onde cabe o ditado:
quem tem mais força chora menos... ou barganha mais.
Na verdade, o governo mataria dois coelhos com
uma só “machadada”, para usarmos um termo da moda. Barganharia em cima das
categorias menos organizadas, economizando dinheiro para pagar – quem sabe? - os
grandes empresários e/ou banqueiros e ainda enfraqueceria e dividiria as várias
categorias do funcionalismo público. Com essas categorias divididas e
enfraquecidas, encontraria um campo fácil para empurrar, de garganta abaixo, sua reforma da previdência e, se
possível, com um rolo compressor em cima da Assembleia Legislativa. Se isto
ocorrer será uma administração “em prol” dos trabalhadores? E isto não é mera
profecia ou exercício de futurismo, pois – é praxe: as constantes “reformas”
econômica e previdenciário no Brasil serviram, no geral, para aumentar a arrecadação do Estado e
diminuir os direitos dos trabalhadores, colocando ainda mais ônus sobre seus
ombros.
Agora, tratemos do nosso Piso Salarial
A luta por um piso salarial, digno, para a nossa
categoria, perde-se no tempo. Mas na
década de setenta do século passado, com um pouco de distensão do autoritarismo
da Ditadura Militar, esta luta se intensificou no Ceará, até que, na década de oitenta, o então Governador Gonzaga Mota atendeu as reivindicações dos professores,
tanto do ensino superior como do ensino médio, fazendo promulgar uma lei e outorgando
um decreto que nos deu direito ao Piso. Isto
ocorreu no final do ano de 1986. Mas o governador que assumiu o cargo em
março de 1987 logo descumpriu a lei do
piso – apesar de, em Carta Aberta aos professores, ter prometido respeitar as conquistas
dos profissionais da educação, inclusive a Lei do Piso (eu tenho cópia desta
carta que, na época, foi amplamente distribuída, sendo documento de domínio
público). De imediato, alegou a inconstitucionalidade
da lei etc., para não cumprir o prometido. A partir daí começa uma longa
disputa judicial de quase trinta anos por sua (do piso) implantação. E os
sucessivos governos, apesar de terem perdido a causa em todas as instâncias,
inclusive na última, no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, teimaram em não cumprir a
lei, sendo o governo do Ceará considerado pela justiça trabalhista um litigante de má fé. A esse respeito, cito
um documento publicado no jornal “Diário
do Nordeste”, edição de 29/10/2012, assinado pelos bravos professores da Rede
de Ensino Superior Público do Estado do Ceará, Maria Tereza de Albuquerque Rocha
e Sousa, Jacinto Luciano da Silva
e José Guedes de Campos Barros. Diz
o manifesto desses educadores sobre a cassação do nosso piso salarial:
“Trata-se
da cassação absurda, ocorrida em março de 1987, por iniciativa do então
governador do Ceará, do piso salarial dos professores das Universidades
Estaduais do Ceará (UECE, URCA, UVA), instituído pela lei estadual 11.247 de 16.12.1986 e pelo decreto 18.292 de 22.12.1986 sancionada pelo
Governador Gonzaga Mota em dezembro de 1986 (D. O. E. de 22.12.1986).
Desnecessário falar das graves consequências sociais de tal medida a uma classe
de si já combalida por salários historicamente depreciados e em desacordo com
as responsabilidades do ofício.
A iniciativa do Estado
em cassar o Piso Salarial foi derrotada em todas as instâncias judiciais. Para
procrastinar a execução da sentença, o Governo do Ceará recorreu ao STF com uma
descabida Reclamação Constitucional (nº 8.613), em 13 de julho de 2009. Foi
derrotado por unanimidade no Pleno do Supremo em 01 de dezembro de 2011.
Desde então, em
vez de se submeter à soberania da mais alta Corte de Justiça do país, o Governo
do Ceará, por sua Procuradoria Geral, vem se valendo de medidas protelatórias,
em indisfarçável litigância de má fé, como já declararam os Tribunais Regional
(TRT) e Superior do Trabalho (TST)”. [grifo, em negrito, do original]
Este texto continua atual e contundente, com exceções
dos ganhos salarias que tivemos no Governo anterior ao atual. Sim, ganhos ocorridos
antes deste atual governo, que se diz trabalhista. E é neste governo atual que estamos na
iminência de perder nossas conquistas trabalhistas.
E, o que é pior, os partidários desses governos
descumpridores da Lei ainda dizem, difamando os professores, que a nossa luta é
uma luta corporativista, o que não é verdade. O corporativismo ocorre quando
uma categoria ou sindicato de trabalhadores ou de empresários colocam seus
interesses particulares acima dos interesses da sociedade em geral. Ora, onde é
que educação é de interesse só de profissionais da educação? Onde é que saúde e
segurança são interesses só de particulares? Ora, são de interesses da
sociedade em geral.
A educação é de interesse universal e nenhuma
sociedade se emancipará enquanto tiver um povo ignorante - e ignorante a ponto
de votar em políticos que traem o pacto social.
A educação é instrumento de libertação da sociedade
como um todo, e os profissionais da educação
- como de algumas outras categorias - precisam de ganhar o suficiente
para atender às demandas por aperfeiçoamento técnico-profissionais, tais como
os aparatos eletroeletrônicos de informáticas,
que são caros. Pagar bem os professores é melhorar o nível da sociedade em
geral, mas é de interesse do sistema manter o povo na ignorância, na mendicância,
na dependência, para votar em políticos corruptos que vendem o Brasil ao
primeiro que lhe balançar um saco com trinta moedas de ouro. É isto o que está
por trás dos interesses inconfessáveis daqueles que dizem que “não há
dinheiro”. Mas há dinheiro para empreiteiros, para banqueiros, para os empresários
que sustentam a máquina da corrupção. Para eles não falta o vil metal.
O nosso Sindicato - SINDESP
Finalmente, quero dizer algumas palavras sobre o
nosso Sindicato - SINDESP. Enquanto o nosso Presidente, Luiz Boaventura de
Souza viveu, manteve o sindicato unido e jamais traiu nossa categoria. Porém, hoje,
estamos iniciando uma fase de transição e há uma interrogação: como vai ser o
nosso Sindicato daqui pra frente? Estará nas mãos de quem vai continuar a nossa
luta ou nas mãos de quem vai arruinar, falir ou destruir o nosso sindicato, o
nosso instrumento de luta, fazendo o jogo do governo, que não quer pagar o piso?
Vai ficar sob o domínio de quem vai trair a categoria ou de quem será fiel à
luta de tantos anos? Só no campo jurídico, nossa
luta completará 30 anos em 2017.
Os inimigos do piso certamente nunca perdoram o nosso
sindicato por não ser “pelego”, e por ter encampado a luta pelo piso salarial.
Os grupos pró-governo, que são contra o
piso e que estão por trás das maquinações,
não tem escrúpulos em usar qualquer subterfúgio, qualquer falácia
jurídica, qualquer sofisma, para impedir a implantação do piso. E, como sempre,
perderam na justiça, e, como sempre, foram desmoralizados em seus
“arrazoados”. E foram derrotados em
todas as instâncias, da primeira à última – que foi o SUPREMO TRIBUNL FEDERAL. Não
estarão essas pessoas em estado de
rancor permanente? Usam a máquina do Estado, suas influências pessoais, tudo
para impedir a concretização do piso? Por que tanta resistência? Será que tal disputa está se tornando
birra? Sabemos que o Estado pode
implantar a Lei do Piso. Mas os inimigos do piso talvez
temam - e por isso também são
“inimigos do povo” - que o piso se estenda ao Segundo e Primeiro
Grau (atualmente, Educação Básica), cujos professores hoje ganham por volta de UM TERÇO do que deveriam ganhar com a efetivação da lei e do decreto assinados
pelo Governador Gonzaga Mota. Não se trata desse piso vergonhoso instituído
pelo Governo Federal, que paga uma quantia irrisória. O piso pelo qual lutamos
remunera melhor o professor. E eles, os grupelhos reacionários, sabem que o
Ceará, implantando o Piso, os outros professores de outros Estados vão querer
um piso idêntico, também, e isto pode provocar uma revolução na educação. E tal
revolução é contrária aos interesses dos que desejam manter o povo na
semiescravidão. O Ceará pode pagar o
piso a seus professores e, ele podendo, os demais Estados vão ter que
poder, o Brasil vai ter que poder, se não quiserem ficar na estagnação, na
antessala do progresso. Pagar não é questão de falta de dinheiro, mas questão
de prioridade. O governo precisa se definir – educação é ou não prioridade? Ou
só é prioridade nas campanhas eleitorais? Nossos governantes do Ceará, que se
dizem progressistas, quando tem a oportunidade de pegar o bonde da História, na
hora H, deixam o trem do progresso
passar. Ora, O BRASIL TEM CONDIÇÕES DE PAGAR, POIS ESTÁ ENTRE AS MAIORES ECONOMIAS DO MUNDO. Mas - poder-se-ia dizer – os
banqueiros não vão permitir. Pois eles, os banqueiros, já demonstraram que
qualquer governo que não se deixar espoliar, será derrubado. E se os interesses
dos banqueiros não forem satisfeitos, até o Presidente da República poderá ser deposto
ou por morte “acidental”, ou por tiros, ou por “doenças misteriosas”, ou por impeachment, ou seja lá por que meio
for. Mesmo que isto seja verdade – e não o duvido - se for assim, então nunca teremos um piso
salarial digno. Ora, não cabe a banqueiro lutar por piso de ninguém. O papel
dos banqueiros é procurarem sempre sugar até a última gota de sangue dos
trabalhadores. Cabe a nós mesmos a luta contra os grupos que pretendem manter a
educação no seu baixo nível de qualidade, como ora acontece.
É esta ganância - dos banqueiros e seus sócios - que
recebem mais de um bilhão de reais por dia, uma das causas que
impedem o nosso país de ser educado, de ter um povo consciente e de ter uma
sociedade menos injusta? Mas eles só
ganham tanto dinheiro porque os políticos corruptos endividam o Estado.
Endividam pela má gestão, pela irresponsabilidade e pela corrupção, confiando
na impunidade.
Por isso, devemos
ter um sindicato leal, livre dos perdulários, que lute pelos interesses da nossa
categoria e pela educação em geral. É suprema ingenuidade pensar que o governo
não esteja de olho no nosso sindicato. A quem interessa a destruição, a
desmoralização do sindicato? Será que vão miná-lo por dentro, infiltrando seus agentes?
É de interesse dos que são contra o piso que o sindicato contraia dívida
astronômica que não possa pagar, que possa desviar verbas, que possa fomentar a
divisão interna e a dissenção da categoria. O lema deles é dividir para reinar
e unir para vencer. E é fácil dividir: é só uma parte das lideranças se orientar
para o lado obscuro da traição e o prejuízo estará consumado.
Por isso devemos estar atentos. Inclusive criando
grupos de WhatsApp para manter e
circular informações – mesmo correndo o risco de dar oportunidade aos “inimigos
do povo” a usarem este instrumento para veiculação de falsas ou desencontradas
informações. Mas este risco é o preço que se paga pela liberdade de expressão.
POR FIM,
DEVEMOS EXIGIR UM CALENDÁRIO ANUAL DE
ASSEMBLÉIAS GERAIS DA NOSSA CATEGORIA PARA OBTERMOS INFORMAÇÕES E
TRANSPARÊNCIA DAS AÇÕES DO NOSSO SINDICATO ATÉ QUE O PISO SEJA IMPLANTADO
DEFINITIVAMENTE.
Noé Martins de Sousa
Professor de
Filosofia da UECE – aposentado
Sócio fundador do
SINDESP
Membro da
Diretoria do SINDESP em várias gestões e membro da atual gestão
Observações
– esta “Carta Aberta” é de minha exclusiva responsabilidade. Noé Martins de
Sousa foi um dos fundadores do PT no Ceará, do qual se desfiliou logo após a
segunda eleição do Presidente Lula e tornou-se desde então, há mais de dez
anos, um “sem partido”. Saiu de livre e espontânea vontade, deixando no
partido boas amizades.
Post-scriptum - Esta “Carta Aberta”, redigida em 21-06-2016, foi
distribuída aos professores da UECE, URCA e UVA na Assembleia da categoria, no
dia 23/06/2016, tendo sido depois modificada ligeiramente. As partes que foram
modificadas, quase in totum,
encontram-se sublinhadas no corpo do texto.
(Obséquio reproduzir e distribuir este documento).
Fortaleza, 23 de junho de 2016. Blogger Noé Martins