terça-feira, 6 de setembro de 2016

CARTA ABERTA AOS PROFESSORES DA EUCE, UVA E URCA



CARTA ABERTA AOS PROFESSORES DA EUCE, UVA E URCA

Sobre o nosso Piso Salarial e outros temas da atual conjuntura


Caros colegas, professores:

Inicialmente, gostaria de prestar minhas homenagens ao amigo e ex-presidente do SINDICATO DOS DOCENTES DO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ - SINDESP, Professor Luiz Boaventura de Souza, falecido recentemente, em março de 2016. O nosso respeito por sua perseverança, dedicação e lealdade à nossa categoria, na luta em sua defesa, especialmente pela implantação do nosso Piso Salarial. Nossa solidariedade à sua família. Saudades.

            Meus colegas. Acabamos de sofrer, agora, mais uma punhalada nas costas. Os responsáveis por mais uma punhalada em nossas costas foram nossos governantes, os atuais mandantes, que se fazem donos do Estado do Ceará.
            Isto não é de surpreender. Os políticos, de modo geral, nossos supostos “representantes”, em campanha eleitoral, prometem defender os interesses da sociedade civil, especialmente dos trabalhadores, seguir o programa de seu partido etc, mas quando se elegem, esquecem as promessas e passam a defender seus interesses pessoais, os interesses dos ricos, principalmente, dos grandes empresários do comercio, da indústria e, máxime, dos banqueiros. Não é de admirar, pois são deles que advém o dinheiro para financiamento de campanhas eleitorais e também a famosa “propina”, conforme se pode constatar diariamente na midia. Não é à toa que o Governo Federal paga mais de  UM BILHÃO de reais POR DIA, só de juros da dívida pública interna, sem abater o principal. Isso é dito e sabido amiúde. Já sabemos que os políticos, de modo geral (ainda não digo, universal), são corruptos e defendem os interesses de seus “donos”. Mas a punhalada que dói mais é a da traição. Da traição daqueles que se dizem defensores dos interesses dos trabalhadores ( e falo dos trabalhadores, pois os capitalistas já tem os seus próprios “defensores”), porém, ao assumirem o poder, renegam suas origens trabalhistas. Senão, vejamos.
            Há várias décadas atrás, Getúlio Vargas, por um momento, se passou por representante dos trabalhadores e instituiu a CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas -  assegurando um rol de direitos para a classe laboriosa. Passados mais de 70 anos, de “avanço” do Capitalismo em nosso País, ao invés de terem ampliado seu leque de direitos, os trabalhadores vem sofrendo, gradativamente, a perda de seus direitos adquiridos, especialmente nesta época do tal “Neoliberalismo”. Isto é progresso? Não, na verdade, é retrocesso. Desde o governo neoliberal iniciado em 1994 e até agora nós, trabalhadores, estamos constantemente perdendo direitos. Mas não é de admirar que os representantes do capital financeiro internacional retirem direitos dos trabalhadores. Mas um partido que se diz trabalhista fazer isto é traição! E, infelizmente, Companheiros, aguardem mais  pancadas no futuro, com a tal reforma da Previdência Social. Ou Previdência medicossocial.  Esperemos!
            Nós, professores do ensino superior público do Ceará, neste mês de junho, fomos surpreendido, como dissemos, com mais um ataque contra os nossos direitos adquiridos. A suspensão do pagamento de uma parcela da dívida trabalhista que o Estado do Ceará nos deve e que vinha sendo paga mensalmente por via de coação judicial. Pois bem, nossos governantes, em parceria com a Justiça (Justiça?) do Trabalho, suspenderam este pagamento, que é um direito adquirido, e adquirido através de sentença judicial transitada em julgado no Supremo Tribunal Federal. E veja:  quem fez isso foi o governo trabalhista do Estado do Ceará, que se elegeu com promessa de defender os interesses dos trabalhadores, os interesses sociais das camadas exploradas do Ceará. Fez isso, em aliança – ou cumplicidade? – com a tal “Justiça do Trabalho”, repetimos.  Alegam os governantes, pelo que se sabe, falta de dinheiro. E as finanças do Estado não estavam saneadas? E por que não falta dinheiro para os grandes empresários que prestam  serviços ao Estado, que fornecem insumos ao Estado? Será por que saem das mãos deles a “grana” que financia a política dos nossos “representantes”? Ora, alegar falta de dinheiro, na nossa opinião, não é desculpa. Nenhum governo, de qualquer lugar do mundo, possui dinheiro suficiente para fazer tudo que almeja. E se não o tem, o que faz? Simplesmente, estabelece prioridades e investe a maior parte dos recursos naquilo que julga prioridade para a sociedade. No caso do governo cearense, que se diz trabalhista – e conhecemos seu programa partidário - socialdemocrata, “socializante”, seu compromisso, que assumiu desde quando ingressou em seu partido, foi de investir, prioritariamente, na área social, especialmente na educação, saúde e segurança pública. Isto é prioridade, não só dos partidos trabalhistas, mas uma exigência ética, especialmente nos países do “Terceiro Mundo”, para usarmos uma expressão da época da guerra fria. No entanto, a prioridade desses governos – federal e estaduais -, no momento, é pagar juros aos banqueiros, esses mesmos banqueiros e seus parceiros que desejam  – vejam-se as notícias na imprensa - se apossar da Petrobras, dos nossos portos, aeroportos, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, dos Correios, da  Eletrobrás, das  rodovias, da casa da moeda, das riquezas da Amazona etc, se não reagirmos. E, o que é pior, sem gastar nem um “tostão de mel coado” do seu bolso, mas somente com os juros que acumularam financiando a rolagem da nossa dívida pública interna. Tal dívida se originou no governo tucano, no final do século passado. No Governo Itamar Franco, essa dívida girava em torno de 63 bilhões de reais. Os governantes da época, alegando sanear as contas do Estado, ajudar bancos privados etc., elevaram os juros  quase ao patamar de 50% ao ano -  refiro-me ao juro oficial do governo ou Taxa Selic -  transferindo dinheiro para os empresários e banqueiros (estes, na realidade, não são empresários, mas “agiotas oficiais”), com o qual “compraram” nossas empresas estatais, nosso patrimônio e, ao invés de quitarem nossa dívida pública interna, elevaram-na ao patamar de 800 bilhões de reais. Consequentemente, ficamos sem boa parte do nosso patrimônio e ainda aumentamos em mais de 12 vezes a dívida pública interna. Isto sim, é que “administrar” bem! Isto sim, é que é Neoliberalismo! De lá para cá, nossos governantes só fizeram “rolar”,  refinanciar a dívida pública, que hoje está em torno de 2,79 trilhões de reais. A estratégia da banqueirada é simples, basta observamos com atenção para compreendê-la. Já que a Justiça do Brasil não funciona e por isso mesmo  incentiva a corrupção e garante a impunidade  – a quem interesse esse tipo “justiça”? – então é só jogar os políticos ladrões para administrar nossas empresas, a fim de quebrarem-nas, endividá-las, inviabilizá-las e, depois, denunciar o Estado brasileiro como mau gestor. Em seguida, ” compram” essas empresas estatais a preço simbólico, apossando-se do patrimônio que restou e, principalmente – do seu Know how e  do seu mercado. Dessa maneira, OS ESPECULADORES ganham nas duas pontas: no início do processo, corrompendo os políticos (e/ou aproveitando a corrupção já existente), que endividam o Estado a fim de pedirem cada vez mais dinheiro emprestado e, em geral, a juros altos. E, no fim do processo, quando a dívida está grande, transformando tal dinheirama (acumulada graças aos juros altos) em ativos das empresas, enfim, se apossando das riquezas do Brasil e – pasmem! – sem gastar um único centavo do seu próprio dinheiro. Usam apenas o dinheiro dos juros que receberam. Isto sim, é que é “investimento”... E ainda dizem que o Brasil não é um lugar bom para se ganhar dinheiro...
E o atual Presidente da República, interino, parece que vai seguir, consciente ou inconscientemente, o mesmo catecismo entreguista, lesa-pátria, adotado pelo tucanato. Não estou afirmando que Sua Excia., a autoridade maior do país, proceda de má fá. Posso até acreditar em sua boa intenção. Sabemos que a boa intenção é condição necessária para a realização de um ato dentro da ética, mas nem sempre é condição suficiente para a sua efetivação. Por isso, a sociedade precisa ficar de olho nas ações do Banco Central e da área econômica em geral. Esta equipe econômica está publicamente ameaçando de aumentar os impostos, dizendo que o país está quebrado, que isto em grande parte é culpa do governo anterior, que a previdência social está falida etc., etc. Tal equipe econômica, não seria testa de ferro dos grandes grupos econômicos, que pretendem retirar  direitos adquiridos dos trabalhadores? Não estaria aterrorizando os empresários com ameaças de mais impostos e encargos a fim de se chegar a um impasse onde só existirá uma única solução  - transferir o patrimônio, as riquezas da União, do povo brasileiro, para  os grandes grupos liderados pelo setor financeiro? Para fazer isso, bastaria contar com o apoio dos empresários brasileiros, ou parte deles, que, como já estão apertados, muito provavelmente aceitariam o desfecho final, o “destino” imutável, como salvação - que seria  a entrega do patrimônio público ao capitalismo predador. Provavelmente, tratariam de conseguir algum proveito dessa possível farra com a dilapidação do patrimônio nacional.
            E mais uma perguntinha: a quem interessa, em última análise, a corrupção e a impunidade que se alastram no Brasil? Ora, especialmente AOS ESPECULADORES, os que enriquecem com juros exorbitantes, é óbvio, pois são eles que mais ganham com as roubalheiras. E ganham muito. Eles sabem que é mais barato comprar os políticos do que as riquezas de um país.
Conta o anedotário popular que, na Roma antiga, existia um homem rico que desejava muito possuir as férteis e produtivas terras de um vizinho. Mas este se recusava a vendê-las. E por isso pedia sempre um preço muito alto, sabendo que ninguém as compraria por um preço tão escorchante. Na realidade, não queria se desfazer de suas terras. Mas era um homem muito louco por dinheiro, pelo ouro. Então, alguém soprou no ouvido daquele que desejava comprar as terras, que o vizinho era apaixonado por ouro e sugeriu que o comprasse como escravo. Na época, a lei permitia que alguém se vendesse como escravo. “Ora – dizia o conselheiro – comprá-lo como escravo sai muito mais barato do que comprar suas terras, mesmo que estas fossem vendidas a preço de mercado. Uma vez tornando-se senhor deste proprietário, automaticamente tais terras serão suas”. E foi o que o sabido comprador fez. E assim foi feliz para sempre.  Isto aqui é uma anedota, mas com relação ao Brasil é uma realidade.
O Brasil é muito rico e seria difícil comprá-lo a preço de mercado. Sai muito mais barato comprar os políticos, fazê-los endividar o Estado e, depois, se apossar das nossas riquezas. Em troca, o Poder Judiciário garantiria a impunidade ou faria, no máximo, um arremedo de punição. É fácil e prático.
            E mais outra perguntinha - por que os corruptos estão quase sempre na direção dos partidos, dos sindicatos, das instituições em geral? Uma das causas é simples. O homem honrado só possui um caminho a seguir numa disputa por cargo ou posição: que é o caminho da honestidade. Já o homem desonrado tem à sua disposição dois caminhos: o da honestidade e o da desonestidade. Usa a honestidade quando lhe é conveniente e a safadeza, o conchavo, a traição, quando necessário. Numa disputa por algum objetivo, desde o início, o desonesto já sai ganhando de dois a um. É por isso que o povão diz: políticos são como feijões crus na água    só sobem os podres.
            Platão diz que nenhum político é honesto. Ele se referia naturalmente à corrupta Atenas de seu tempo. Mas é possível que ainda existam políticos honestos? Ora, assim como dentre espinhos   nascem flores, por que não poderia um político honesto nascer do meio desse cipoal de corrupção? Mas reconhecemos que é muito difícil um homem honesto chegar ao poder, ao posto de mando, nas instituições do Brasil. E, se chagar, o que poderá fazer no meio de tantos que são desonestos?
 Esses grandes grupos precisam aprender que é necessário deixar um mínimo de esperança para o povo conseguir resolver seus problemas dentro do quadro jurídico do Estado de Direito.  Em verdade, estamos numa ditadura que mata por tortura. Que é, senão tortura,  a morte daqueles que falecem gritando de dor nos corredores dos hospitais, sem receber os devidos cuidados? Que é, senão tortura, a realidade de que 40% dos que tem câncer não são atendidos no prazo legal e acabam morrendo prematuramente em consequência do atraso no atendimento? Que é, senão morte por tortura, quando um subalimentado contrai uma doença oportunista e perece à míngua, sem assistência medicossocial? Quando o povo brasileiro descobrir que é melhor morrer de desgraça do que de miséria, certamente haverá rebelião e talvez rebelião muito violenta. E não estou aqui pregando a desobediência civil. Estou mostrando uma realidade, uma questão de fato, que ocorre no Brasil: a roubalheira desenfreada e o povo na miséria, sem educação, sem assistência médica, sem segurança pública e, se não houver um reforma previdenciária justa, sem seguridade social.  E, também, me baseando na doutrina do filósofo inglês, John Locke, o pai do Liberalismo, tão elogiado pela burguesia, quando se trata de usar sua filosofia como ideologia em defesa do capitalismo liberal.  Mas Locke  tem um outro lado. Ele defende o direito de rebelião. É só ler o seu “Segundo Tratado do Governo”.  E o que ele diz não é coisa de comunismo pois este prega uma revolução, isto é, mudança radical nas estruturas da sociedade, substituindo o sistema capitalista pelo sistema socialista. Ora, Locke  não defende a derrubado do sistema capitalista, mas a derrubado dos governantes no sistema capitalista. Para Locke, o governante é apenas um fiel depositário da confiança do povo, da chamada “sociedade civil”. No momento em que trai esta confiança, o pacto social se desfaz automaticamente. O governante deixa de ser representante do povo e este pode derrubá-lo inclusive pela violência. É isto que os atuais “neoliberais” esquecem, porque na realidade este tal neoliberalismo é apenas um conjunto de propaganda midiática enganosa para encobrir os interesses dos grandes grupos monopolizantes, dos oligopólios, que pretendem se apoderar das riquezas das nações, principalmente dos países em desenvolvimento. Recentemente, analistas da área econômica constataram que durante a tal “crise” (provocada ou incentivada pelos grandes grupos?) de 2008-9, os muito ricos (pessoas físicas e jurídicas) ficaram mais ricos e houve uma maior concentração de renda, em nível mundial. O tal liberalismo só é bom quando satisfaz à ganância dos grandes grupos econômicos - o resto é tapeação.
            Voltemos ao caso do Sistema Previdenciário, o setor escolhido agora para ocupar espaço na mídia e ser o vilão da vez. Os nossos governantes faliram a previdência, ora por incompetência administrativa, ora por roubalheira, e ora por retiradas irresponsáveis. Atualmente, desejam sua “reforma” e, suspeitamos, para fatiá-la e privatizá-la, se puderem. Desde Juscelino Kubtischek (ele mesmo o confessa em seu Livro “Por que construí Brasília”, 2ª edição, Senado Federal, 2009) se retira dinheiro da Previdência, para não recuarmos mais no tempo. Este grande estadista cometeu essa falha: confessa que retirou dinheiro da Previdência para construir nossa Capital. Os militares, nos governos seguintes, também usaram dinheiro da Previdência para construírem as grandes obras da época. Ora, não somos contra que se retire esse dinheiro ocioso da Previdência para aplicar na construção de obras, contanto que  este dinheiro seja devolvido com juros e correção monetária, o que não fizeram. E, agora mesmo, o Congresso Nacional está aprovando a elevação da DRU (Desvinculação das Receitas da União), de 20% para 30% do orçamento federal.  Quer dizer, o Presidente pode retirar até trinta por cento do dinheiro de um setor para gastar em outro, sem  aprovação prévia do Congresso. Assim, o governo se livra das famosas “pedaladas” e ainda pode desviar até 30% da previdência, da Saúde, da Educação, da área de Segurança etc., sem cometer crime de responsabilidade. Isto sim, é receber um cheque assinado em branco. Ora, não existe o tal “problema” da Previdência. O que ocorre é má administração. Existe um ramo da matemática aplicada (Estatística), chamada Atuária que trata do assunto. É só aplicá-la e seguir as regras do jogo, pois o que existe, como se disse, é má gestão. É ótimo, para os governantes, praticarem rombos e mais rombos e depois jogarem as dívidas nas costas dos trabalhadores. A solução é o governo pagar o que deve à previdência e, daqui pra frente, criar mecanismos de controle que tapem esse barril sem fundo. E que o governo  não administre, sozinho, os fundos previdenciários, mas que contem com fiscalização de representantes das classes trabalhadoras e empresariais, além de usar o mecanismo do resseguro, como mais um recurso de precaução. E que a justiça volte a funcionar, punindo seus saqueadores. É verdade que, como reza o ditado popular, não existe cofre forte pra ladrão eficiente, mas as medidas de precauções dificultam bastante as fraudes. O que não se pode é facilitar a roubalheira, como ocorre hoje.
Mas não nos iludamos, companheiros. Se esta Reforma previdenciária for aprovada em nível federal, muito provavelmente será para retirar mais direitos adquiridos dos trabalhadores. E tal reforma vai certamente repercutir nas Unidades da Federação. O fato de o Governo do Ceará não ter dado ainda aumento – ou reajuste -  aos servidores neste ano é mau sinal e poderá até contribuir para mais um assalto aos direitos dos trabalhadores em nosso Estado. Senão, vejamos, por hipótese, o que poderia acontecer – e esperamos que não aconteça.
            O governador anterior, Sua Excia., Sr. Cid Gomes, foi mentor da Lei que antecipou  a data base dos aumentos ou reajustes dos servidores públicos estaduais, passando a data de junho para janeiro de cada ano. Prometeu que daria no mínimo a inflação acumulada do ano, pois – é claro - se não fizesse isto, não estaria fazendo “reajuste”.  E cumpriu o que prometeu. Mas o que fez o seu sucessor, um trabalhista? Até agora só deu reajuste ( como “reajuste” se foi abaixo da inflação acumulada de um ano?) para quem  ganha o piso salarial do Estado. A maioria das categorias vai ter que “negociar”. Quer dizer, meter o pescoço no laço da forca. Serão categorias fragilizadas, talvez endividadas no comércio e subordinadas a um governo insensível, negociando com quem tem o tacão de ferro na mão. É aí onde cabe  o ditado: quem tem mais força chora menos... ou barganha mais.
 Na verdade, o governo mataria dois coelhos com uma só “machadada”, para usarmos um termo da moda. Barganharia em cima das categorias menos organizadas, economizando dinheiro para pagar – quem sabe? - os grandes empresários e/ou banqueiros e ainda enfraqueceria e dividiria as várias categorias do funcionalismo público. Com essas categorias divididas e enfraquecidas, encontraria um campo fácil para empurrar, de garganta abaixo, sua reforma da previdência e, se possível, com um rolo compressor em cima da Assembleia Legislativa. Se isto ocorrer será uma administração “em prol” dos trabalhadores? E isto não é mera profecia ou exercício de futurismo, pois – é praxe: as constantes “reformas” econômica e previdenciário no Brasil serviram, no geral,  para aumentar a arrecadação do Estado e diminuir os direitos dos trabalhadores, colocando ainda mais ônus sobre seus ombros.

                Agora, tratemos do nosso Piso Salarial

                A luta por um piso salarial, digno, para a nossa categoria,  perde-se no tempo. Mas na década de setenta do século passado, com um pouco de distensão do autoritarismo da Ditadura Militar, esta luta se intensificou no Ceará, até que, na década de oitenta, o então Governador Gonzaga Mota atendeu as reivindicações dos professores, tanto do ensino superior como do ensino médio, fazendo promulgar uma lei e outorgando um decreto que nos deu direito ao Piso. Isto  ocorreu no final do ano de 1986. Mas o governador que assumiu o cargo em março de 1987  logo descumpriu a lei do piso – apesar de, em Carta Aberta aos professores, ter prometido respeitar as conquistas dos profissionais da educação, inclusive a Lei do Piso (eu tenho cópia desta carta que, na época, foi amplamente distribuída, sendo documento de domínio público).  De imediato, alegou a inconstitucionalidade da lei etc., para não cumprir o prometido. A partir daí começa uma longa disputa judicial de quase trinta anos por sua (do piso) implantação. E os sucessivos governos, apesar de terem perdido a causa em todas as instâncias, inclusive na última, no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, teimaram em não cumprir a lei, sendo o governo do Ceará considerado pela justiça trabalhista um litigante de má fé. A esse respeito, cito um documento publicado no jornal  “Diário do Nordeste”, edição de 29/10/2012, assinado pelos bravos professores da Rede de Ensino Superior Público do Estado do Ceará, Maria Tereza de Albuquerque Rocha e Sousa, Jacinto Luciano da Silva e José Guedes de Campos Barros. Diz o manifesto desses educadores sobre a cassação do nosso piso salarial:

 “Trata-se da cassação absurda, ocorrida em março de 1987, por iniciativa do então governador do Ceará, do piso salarial dos professores das Universidades Estaduais do Ceará (UECE, URCA, UVA), instituído pela lei estadual 11.247 de 16.12.1986 e pelo decreto 18.292 de 22.12.1986 sancionada pelo Governador Gonzaga Mota em dezembro de 1986 (D. O. E. de 22.12.1986). Desnecessário falar das graves consequências sociais de tal medida a uma classe de si já combalida por salários historicamente depreciados e em desacordo com as responsabilidades do ofício.
                A iniciativa do Estado em cassar o Piso Salarial foi derrotada em todas as instâncias judiciais. Para procrastinar a execução da sentença, o Governo do Ceará recorreu ao STF com uma descabida Reclamação Constitucional (nº 8.613), em 13 de julho de 2009. Foi derrotado por unanimidade no Pleno do Supremo em 01 de dezembro de 2011.
                Desde então, em vez de se submeter à soberania da mais alta Corte de Justiça do país, o Governo do Ceará, por sua Procuradoria Geral, vem se valendo de medidas protelatórias, em indisfarçável litigância de má fé, como já declararam os Tribunais Regional (TRT) e Superior do Trabalho (TST)”. [grifo, em negrito, do original]

                Este texto continua atual e contundente, com exceções dos ganhos salarias que tivemos no Governo anterior ao atual. Sim, ganhos ocorridos antes deste atual governo, que se diz trabalhista.  E é neste governo atual que estamos na iminência de perder nossas conquistas trabalhistas.
                E, o que é pior, os partidários desses governos descumpridores da Lei ainda dizem, difamando os professores, que a nossa luta é uma luta corporativista, o que não é verdade. O corporativismo ocorre quando uma categoria ou sindicato de trabalhadores ou de empresários colocam seus interesses particulares acima dos interesses da sociedade em geral. Ora, onde é que educação é de interesse só de profissionais da educação? Onde é que saúde e segurança são interesses só de particulares? Ora, são de interesses da sociedade em geral.
                A educação é de interesse universal e nenhuma sociedade se emancipará enquanto tiver um povo ignorante - e ignorante a ponto de votar em políticos que traem o pacto social.
                A educação é instrumento de libertação da sociedade como um todo, e os profissionais da educação  - como de algumas outras categorias - precisam de ganhar o suficiente para atender às demandas por aperfeiçoamento técnico-profissionais, tais como os aparatos eletroeletrônicos de  informáticas, que são caros. Pagar bem os professores é melhorar o nível da sociedade em geral, mas é de interesse do sistema  manter o povo na ignorância, na mendicância, na dependência, para votar em políticos corruptos que vendem o Brasil ao primeiro que lhe balançar um saco com trinta moedas de ouro. É isto o que está por trás dos interesses inconfessáveis daqueles que dizem que “não há dinheiro”. Mas há dinheiro para empreiteiros, para banqueiros, para os empresários que sustentam a máquina da corrupção. Para eles não falta o vil metal.

                O nosso Sindicato - SINDESP

                Finalmente, quero dizer algumas palavras sobre o nosso Sindicato - SINDESP. Enquanto o nosso Presidente, Luiz Boaventura de Souza viveu, manteve o sindicato unido e jamais traiu nossa categoria. Porém, hoje, estamos iniciando uma fase de transição e há uma interrogação: como vai ser o nosso Sindicato daqui pra frente? Estará nas mãos de quem vai continuar a nossa luta ou nas mãos de quem vai arruinar, falir ou destruir o nosso sindicato, o nosso instrumento de luta, fazendo o jogo do governo, que não quer pagar o piso? Vai ficar sob o domínio de quem vai trair a categoria ou de quem será fiel à luta de tantos anos? Só no campo jurídico, nossa luta completará 30 anos em 2017.
                Os inimigos do piso certamente nunca perdoram o nosso sindicato por não ser “pelego”, e por ter encampado a luta pelo piso salarial. Os grupos  pró-governo, que são contra o piso e que estão por trás das maquinações,  não tem escrúpulos em usar qualquer subterfúgio, qualquer falácia jurídica, qualquer sofisma, para impedir a implantação do piso. E, como sempre, perderam na justiça, e, como sempre, foram desmoralizados em seus “arrazoados”.  E foram derrotados em todas as instâncias, da primeira à última – que foi o SUPREMO TRIBUNL FEDERAL. Não estarão essas pessoas  em estado de rancor permanente? Usam a máquina do Estado, suas influências pessoais, tudo para impedir a concretização do piso? Por que tanta resistência?  Será que tal disputa está se tornando birra?  Sabemos que o Estado pode implantar a Lei do Piso. Mas os inimigos do piso  talvez  temam  - e por isso também são “inimigos do povo” - que o piso se estenda ao Segundo e Primeiro Grau (atualmente, Educação Básica), cujos professores hoje ganham por volta de UM TERÇO do que deveriam ganhar com a efetivação da lei e do decreto assinados pelo Governador Gonzaga Mota. Não se trata desse piso vergonhoso instituído pelo Governo Federal, que paga uma quantia irrisória. O piso pelo qual lutamos remunera melhor o professor. E eles, os grupelhos reacionários, sabem que o Ceará, implantando o Piso, os outros professores de outros Estados vão querer um piso idêntico, também, e isto pode provocar uma revolução na educação. E tal revolução é contrária aos interesses dos que desejam manter o povo na semiescravidão. O Ceará pode pagar o piso a seus professores e, ele podendo, os demais Estados vão ter que poder, o Brasil vai ter que poder, se não quiserem ficar na estagnação, na antessala do progresso. Pagar não é questão de falta de dinheiro, mas questão de prioridade. O governo precisa se definir – educação é ou não prioridade? Ou só é prioridade nas campanhas eleitorais? Nossos governantes do Ceará, que se dizem progressistas, quando tem a oportunidade de pegar o bonde da História, na hora H,  deixam o trem do progresso passar. Ora, O BRASIL TEM CONDIÇÕES DE PAGAR, POIS ESTÁ ENTRE AS MAIORES ECONOMIAS DO MUNDO.  Mas - poder-se-ia dizer – os banqueiros não vão permitir. Pois eles, os banqueiros, já demonstraram que qualquer governo que não se deixar espoliar, será derrubado. E se os interesses dos banqueiros não forem satisfeitos, até o Presidente da República poderá ser deposto ou por morte “acidental”, ou por tiros, ou por “doenças misteriosas”, ou por impeachment, ou seja lá por que meio for. Mesmo que isto seja verdade – e não o duvido -  se for assim, então nunca teremos um piso salarial digno. Ora, não cabe a banqueiro lutar por piso de ninguém. O papel dos banqueiros é procurarem sempre sugar até a última gota de sangue dos trabalhadores. Cabe a nós mesmos a luta contra os grupos que pretendem manter a educação no seu baixo nível de qualidade, como ora acontece.
                É esta ganância - dos banqueiros e seus sócios - que recebem mais de um bilhão de reais por dia, uma das causas que impedem o nosso país de ser educado, de ter um povo consciente e de ter uma sociedade menos injusta?  Mas eles só ganham tanto dinheiro porque os políticos corruptos endividam o Estado. Endividam pela má gestão, pela irresponsabilidade e pela corrupção, confiando na impunidade.
Por isso, devemos ter um sindicato leal, livre dos perdulários, que lute pelos interesses da nossa categoria e pela educação em geral. É suprema ingenuidade pensar que o governo não esteja de olho no nosso sindicato. A quem interessa a destruição, a desmoralização do sindicato? Será que vão  miná-lo por dentro, infiltrando seus agentes? É de interesse dos que são contra o piso que o sindicato contraia dívida astronômica que não possa pagar, que possa desviar verbas, que possa fomentar a divisão interna e a dissenção da categoria. O lema deles é dividir para reinar e unir para vencer. E é fácil dividir: é só uma parte das lideranças se orientar para o lado obscuro da traição e o prejuízo estará consumado.
                Por isso devemos estar atentos. Inclusive criando grupos de WhatsApp para manter e circular informações – mesmo correndo o risco de dar oportunidade aos “inimigos do povo” a usarem este instrumento para veiculação de falsas ou desencontradas informações. Mas este risco é o preço que se paga pela liberdade de expressão.

POR FIM, DEVEMOS EXIGIR UM CALENDÁRIO ANUAL DE ASSEMBLÉIAS GERAIS DA NOSSA CATEGORIA PARA OBTERMOS INFORMAÇÕES E TRANSPARÊNCIA DAS AÇÕES DO NOSSO SINDICATO ATÉ QUE O PISO SEJA IMPLANTADO DEFINITIVAMENTE.


Noé Martins de Sousa
Professor de Filosofia da UECE – aposentado
Sócio fundador do SINDESP
Membro da Diretoria do SINDESP em várias gestões e membro da atual gestão

Observações – esta “Carta Aberta” é de minha exclusiva responsabilidade. Noé Martins de Sousa foi um dos fundadores do PT no Ceará, do qual se desfiliou logo após a segunda eleição do Presidente Lula e tornou-se desde então, há mais de dez anos, um “sem partido”. Saiu de livre e espontânea vontade, deixando no partido boas amizades.
Post-scriptum - Esta “Carta Aberta”, redigida em 21-06-2016, foi distribuída aos professores da UECE, URCA e UVA na Assembleia da categoria, no dia 23/06/2016, tendo sido depois modificada ligeiramente. As partes que foram modificadas, quase in totum, encontram-se sublinhadas no corpo do texto.
(Obséquio reproduzir e distribuir este documento).
Fortaleza, 23 de junho de 2016. Blogger Noé Martins